Voava de
flor em flor…
Mas, só para me divertir e vigiar as Abelhas, que em seu dia-a-dia, saiam do
Cortiço para a quotidiana recolha de pólen.
Eu gostava de acompanhá-las em seus
voos à procura de novas flores, no meio dos bosques e dos campos.
Delirava com o rico perfume certas espécies florais e vibrava com a tamanha
variedade de cores que se viam em todo o redor.
Como um dos Zangões da mais alta hierarquia entre os Zangões da minha Colmeia e
das restantes que compunham a nossa Comunidade de Colmeias, eu era considerado
o Chefe da Guarda da Rainha principal, a mãe das Rainhas das restantes Colmeias.
Uma das minhas missões era a de guardar a Colmeia da Rainha Mãe e comandar a Guarda das
restantes Colmeias, contra ataques de outros insectos, sobretudo, de outras Abelhas
invasoras, Vespas, Formigas e outros.
Outro dos meus trabalhos era o de fertilizar a Abelha-Mestra principal ou
Rainha Mãe.
Um belo dia, em um dia em que meus serviços não eram assim tão necessários na
organização da Guarda, lá andava eu em um de meus habituais voos exploratórios
pelos campos, quando, quase bati de frente numa Abelha que, distraída, quase me
abalroara.
Quase parei em pleno voo e gritei em sua direcção, - “Amiga, quase me
atropelavas em teu voo distraído!”
Parecendo não me ter ouvido, ela seguiu seu destino...
Nisso, virei-me e voei em sua perseguição, tentando aproximar-me dela.
À medida que me ia achegando, fui-me apercebendo que ela não tinha a habitual
cor amarelado-doirado e as faixas pretas intercaladas, usuais nas Abelhas
normais.
Era de uma mistura de cores metalizadas e vivazes. A parte de trás do seu corpo
apresentava-se num verde prata intenso e na parte da frente, num vermelho fogo
metálico.
Contudo, o seu volume e aspecto físicos eram muito semelhantes aos das Abelhas
da minha espécie, não faltando as listas pretas.
Quando finalmente me consegui colocar ao seu lado e olhei em seus olhos, quase
perdi o equilíbrio de meu voo e quase me despenhei contra a flora à frente.
Lá me recompus e voltei a colocar-me ao seu lado, voando a par dela. Voltei a
dirigir a palavra a ela novamente, - “De que Colmeia és tu?”
Ela continuou imperturbável, ignorando-me por completo. Seu voo era firme e
determinado e via-se que estava disposta em não ser interrompida por nada.
Dando mais energia às minhas asas, num impulso mais forte, comecei a voar para
me colocar a sua frente.
Tentei impedi-la de prosseguir, tendo-lhe dado uma nova ordem, - “Ou páras já e
te identificas, ou serei obrigado a deter a tua marcha”
Subitamente e quase que impedida pelo meu bloqueio de continuar em frente, ela
desacelerou e falou, - “Eu sou uma futura Rainha de Colmeia”
Foi a minha vez de replicar, - “Mas, que fazes tu aqui no meio de nosso
território e de onde vieste?”
- “Sabia pelos odores que, este território, tem um Enxame determinado como dono
do mesmo, contudo, não pude evitar atravessa-lo para tentar chegar ao meu
objectivo no mais curto de espaço de tempo possível”, respondeu ela.
Continuando, ela disse, - “Se não passar por aqui, encurtando a distancia até ao meu destino, minha futura
Colmeia poderá nunca vir a formar-se. Recebi a mensagem de uma de minhas
súbditas que, há um Enxame de Vespas, que anda perto do local que escolhemos e no
qual estamos a preparar para fazer nosso Cortiço. E se não chego lá a tempo,
meu Enxame não terá meu comando e não oferecerá qualquer defesa ou resistência
contra as tais Vespas”
- “Eu sou o Zângão Chefe da Guarda dos Zangões da minha Colonia de Colmeias
e não devo afastar-me muito do meu território, pois, posso ser destituído de
meu cargo e de até, ser
expulso da Colmeia e ser condenado ao desterro”, disse eu.
Ela, em tom meio desesperado e agitado, foi dizendo, - “Por favor, deixa-me
continuar meu voo, pois, quanto mais tempo demorar, pior para a minha futura
Colmeia!”
Ela continuou, - “Já vi que pensas que sou tua inimiga, talvez porque sejamos
de cores diferentes!”...
Por acaso, já me tinha quase esquecido que ela tinha cores diferentes das
habituais das Abelhas comuns. Vou e digo-lhe, “Ainda não me respondeste de que
Colmeia vens ou onde pertences? Tu nada tens a ver com a nossa espécie e porquê
apresentas essas cores metalizadas tão intensas?”
- “Olha lá, e tu sabes porque és amarelo e preto?”, foi ela dizendo com certa
firmeza.
Fiquei meio desconcertado com essa sua pergunta.
- “Se não sabes responder, o melhor é deixar que eu siga o meu caminho, pois, já não tenho muito tempo para salvar
a minha futura Colmeia”, disse ela com ar desafiante.
Sem ter ficado muito ciente de mim, abri caminho e deixei-a seguir...
Uns tempos passados mais tarde, estava eu à porta de uma
das Colmeias de nosso Enxame, que ora já ia ocupando um largo território,
quando vi vários Zangões exploradores chegarem em voos apressados e sem pararem
ao pé de mim, irem directo para o interior da Colmeia para junto da Rainha Mãe. No inicio não liguei muito ao
assunto, porque já era de certa forma habitual, que viessem outros Zangões e voassem
directamente até à presença da Rainha, para a
fertilizarem também. Quando acabavam de praticar o ritual da fertilização,
voltavam a sair para os seus postos de guarda, fosse lá onde fosse.
Mas, esse encontro estava revelando-se algo muito diferente. Em função do que
eles tinham comunicado a Rainha, ela começou a emitir um zunido vibratório
muito intenso, que era usualmente utilizado para reunir os Zangões à sua volta.
Algo de grave estava a acontecer!
Quando me acheguei à Rainha, já uma parte dos Zangões tinha estado em sua
presença e de imediato partiam para o exterior da Colmeia. A eles, outros
Zangões das Colmeias vizinhas se juntavam num autentico exercito aéreo.
Mal entrei em contacto com a Abelha Mestra Mãe, ela foi-me transmitindo a razão do que levava a tal alerta mobilizativo.
Havia uma enorme força de Vespas vindas na direcção de
nossas Colmeias e havia que as tentar travar muito antes que elas conseguissem
atravessar o nosso território e lhes fosse permitido entrar nas Colmeias, o que
seria o provável fim para de algumas delas, senão para todas.
As Vespas costumavam vir em formações cerradas e atacavam tudo à sua passagem
sem dó e nem piedade. Uma Vespa, de tamanho muitas vezes maior, conseguia lutar
contra dez ou mais Abelhas de uma só vez e despedaçá-las. Milhares de Abelhas
morriam em tais arrasadores ataques. Muitas vezes, eram tão avassaladoras que,
conseguiam penetrar nas Colmeias e dominar e destruir as Rainhas. Com isso,
dominavam e destruíam por completo as Colmeias. As Abelhas que sobravam, acabavam
sucumbindo mais tarde, votadas à sua sorte, ao abandono e à fome certa.
Ouviram-se
os primeiros zumbidos aterradores ao longe. Os Zangões, acompanhados de Abelhas
trabalhadoras comuns, que reforçavam a defesa, moviam-se na direcção da nuvem
ameaçadora, que agora, já se visualizava claramente. O roncar do voo colectivo
das Vespas era de tal ordem, que muitas das Abelhas e alguns dos Zangões, pura
e simplesmente, assustadas, fugiram em direcção às nossas Colmeias.
As primeiras Vespas estavam perto de mais, e já não havia outro remédio que não
lutar até à morte.
Organizei pequenos esquadrões mistos de dez Zangões e dez Abelhas para atacar
cada Vespa.
Assim que as primeiras chegaram, voamos em formação compacta na direcção das
que vinham à frente, tentando barrar as primeiras. Um Zângão ía a uma das
patas, outro a outra pata, outro a uma das asas e outro ainda, a uma antena e
assim por diante. As Abelhas iam espetando seus ferrões nas partes mais moles
dos corpos das Vespas, entre as suas cascas duras. Uma a uma, as Vespas da
frente iam caindo. Junto com elas caiam alguns Zangões e Abelhas, também
despedaçados pela força muito
maior das Vespas. A batalha começava a ficar desequilibrada, com as Vespas em
grande numero e força, a
conseguirem perfurar as nossas linhas defensivas.
Ao longe, via-se a agitação crescente nas entradas das Colmeias. Muitas das Vespas
já lá estavam a desbaratar as Abelhas que tentavam defender as entradas de
acesso ao interior das Colmeias.
Depois de muita luta e alguns ferimentos, decidi fazer recuar a força dos Zangões para as entradas,
sobretudo das Colmeias que pareciam estar ainda intactas e de ter alguma
hipótese de defesa.
Muitas Abelhas voavam tontas e confusas para fora das Colmeias, não sabendo
mais o que fazer e nem como reagir. À medida que as Vespas iam tomando as
Colmeias, iam deixando uma onda de caos e destruição nos seus interiores. Elas
vinham para invadir as Colmeias, destruir as Rainhas de cada Colmeia e para
comer as larvas e o mel dos favos.
Algumas já
haviam chegado à entrada da Colmeia onde estava a Rainha principal, a que eu
defendia, desde que era o Chefe da Guarda. Quando aconteciam tais ataques,
Abelhões e Abelhas concentravam-se em desviar a atenção dos atacantes para as
outras Colmeias, onde havia Rainhas mais novas, procurando defender em ultimo
lugar, reduto da Rainha das Rainhas, como estava agora acontecendo.
Apesar de nossa defesa ser impressionantemente compacta e firme na luta,
algumas Vespas haviam conseguido mesmo meio feridas, penetrar nas Colmeias. Algumas
de tão fortes, pareciam não sentir os mais de 20 ou mais Zangões e Abelhas
agarrados a seus corpos. Mais pareciam tanques em marcha imparável rumo ao
objectivo, que era o centro da Colmeia e a Abelha Mãe.
Já quase dados por vencidos e débeis pelas feridas da batalha atroz, ouvimos um
zumbido fraco primeiro, para depois, mais parecendo um autêntico trovão, vermos
no horizonte próximo, um enorme Enxame multicolorido prateado, reluzindo contra
os raios de Sol. Parecia mais um foguete ou um raio sem forma definida, vindo
em nossa direcção. Ainda cheguei a pensar o que mais seria aquilo, depois de
estarmos quase destruídos e derrotados, que nos estaria prestes a cair em cima!
Não demorou muito para que a respostas chegasse.
Como balas passando por nós, dividindo-se várias direcções, rumo também a outras Colmeias, aquilo que pareciam ser Abelhas
de tom verde e vermelho prateado, reluzentes, mergulhava no que restava da
batalha e atirava-se com um vigor desmesurado contra as Vespas. Nunca antes
havia visto tanta coragem e determinação numa batalha. As Vespas, uma a uma,
iam caindo desfeitas no chão. Outras, meio moribundas pejavam o solo,
arrastando-se para o mais longe possível, algumas sem patas ou asas.
A meio da destruição e do caos da intensidade da batalha, alguma ordem foi
começando a surgir. Ali, olhei para uma determinada Abelha, que me parecia
estar no comando destas tais Abelhas verdes e vermelhas prateadas, e à medida
que ela se foi aproximando de mim, vi logo que se tratava da Abelha com quem me
cruzara uns bons tempos antes...
- “Amigo Abelhão, sou eu a Abelha que deixaste passar,
que para ti não passava de uma estranha, por ter aspecto diferente do teu.
Estas vespas eram as mesmas que andavam rodando naquela ocasião a Colmeia que
eu estava constituindo. Consegui lá chegar a tempo, depois que me deixaste passar,
para organizar a nossa defesa. Como ainda estávamos a formar a Colmeia, tivemos
que arranjar formas de despistar as Vespas, que tinham uma força considerável, disfarçando e
camuflando o melhor que pudemos o nosso Cortiço. Tapámos as entradas com barro e como
nós fazemos as Colmeias nas encostas de terra, foi fácil de dissimular a nossa.
Assim, elas
procuraram, mas, nem sequer o cheiro conseguiram detectar, pois,
também produzimos certas hormonas que confundem outros insectos. No entanto, as
Vespas formaram Colonias não muito longe de nossa Colmeia, tornando-se um
perigo constante. Contudo, quando vimos que elas estavam começando a rondar
vosso território, sentimos que elas vos atacariam um dia. Quando vimos que nos
tínhamos multiplicado o suficiente e nossa Colonia era já grande e poderosa, decidimos vir
juntar-nos a vocês. Contudo, elas foram mais rápidas e chegaram cá primeiro,
não tendo conseguido evitar que uma boa parte de vossas Colmeias e Rainhas
tivesse sido destruídas por elas!”, disse com ar altivo, aquela que parecia
falar com um certo ar de Rainha dessa tais Abelhas misteriosas.
Cansado se muito ferido, perguntei, - “Porque vir em nossa ajuda, quando as
lutas com as Vespas causam sempre muitas vitimas, levando quase sempre à
derrota das Abelhas, mais pequenas?”
Ela respondeu, -“Já naquela altura te havia demonstrado que eu era um Rainha e
tu, apesar da duvida e de eu não ser da tua espécie, deixaste-me passar, permitindo
que eu salvasse as minhas Abelhas e a minha futura Colmeia, pelo que, em
retribuição, decidi fazer algo por ti e pelas tuas Abelhas, vindo em socorro de
vossas Colmeias. Agora, é hora de limparmos as Colmeias e
de te ajudarmos a reorganizar as mesmas, antes de partirmos”.
Depois de inspeccionados os danos e de termos levado
Abelhas e Vespas mortas para um lugar afastado, concluímos tristemente que,
todas as Abelhas Rainhas das restantes Colmeias da nossa Comunidade haviam sido
mortas, à excepção da Rainha das Rainhas. Contudo, aquela estava agora
moribunda, devido aos ataques sofridos por algumas das Vespas que furaram as
nossas defesas. Ficamos meios desesperados e sem saber o que fazer. Quase que
decidimos a meio de tanta desolação e destruição, abandonar as nossas Colmeias
e ir à procura de outras Comunidades de Abelhas algures, onde nos pudéssemos
integrar. Muito provavelmente, só os Zangões, devido a seus papéis reprodutores,
seriam aceites. As Abelhas trabalhadoras não seriam tão facilmente aceites e
acabariam por sucumbir algures dispersas e perdidas pelos campos. Seria o fim
da nossa Comunidade como tal.
Não perdendo a cabeça, decidimos acompanhar a Rainha verde e vermelha prateada
de volta à sua Colmeia, em tom de agradecimento, e isto também, porque ela
aceitou gentilmente ceder-nos uma nova Rainha, que estava sendo formada em sua
Colmeia e que, teria a função de desmultiplicar-se por outra futura Colonia,
mas que, neste caso, viria connosco para nos ajudar a repopular as nossas
Colmeias. Quando nos despedíamos, a Rainha verde vermelha prateada, em tom
totalmente nobre, olhando para mim em meus olhos, virou-se para as suas Abelhas,
dizendo, - “Queridas Filhas e Filhos da minha Colmeia, hoje será o dia em que
vós sereis autónomos e em que terão uma nova e jovem Abelha Mestra a
comandar-vos. Ela já esta
formada e será ela, a partir de hoje, a vossa nova
Rainha. Eu, por opção minha, vou ajudar estes nossos amigos e aqui o meu amigo
Zângão amarelo e preto, a formar as Colmeias e a dar continuidade às
Comunidades de suas abelhas. Houve uma festa naquele momento, com mel e geleia
real posta a disposição de todas as Abelhas, anfitriãs e visitas, que comeram
até se fartarem. Após isso, partimos
com a nova Rainha Mãe de volta à nossa Colonia Colmeias...
A meio do caminho, a Rainha verde e vermelho prateado
virou-se para nós, - “Só há um senão, e que vós estais ainda a tempo de
corrigir e decidir ser será ou não certo que o que irá acontecer daqui para a frente!”
Fiquei meio atónito e perguntei, - “E o que será que nos levará tomar outra decisão diferente?”
Amigo Zângão amarelo e preto, - “Na verdade, nunca me saíste da cabeça e desde
aquela vez, que me apaixonei por ti. Contudo, por seres diferente e pertenceres
a uma Comunidade distinta de Abelhas, pensei que nunca seria possível nós um
dia virmos a ficar juntos e a formarmos uma nova Comunidade! Mas, parece que
isso estarás prestes a acontecer agora. Como
disse, há um senão! Que, é o de sermos diferentes e de que,
a partir daqui, todas as Abelhas e Zangões que eu conceber, mesmo sendo
fertilizados por ti e pelos restantes Zangões, terão particularidades minhas e
vossas misturadas. Seremos portanto, ora em diante, uma nova espécie de Abelhas
verde-vermelho e amarelo-preto com tom prateado ou doirado. Portanto, se ainda
me quiserem aceitar, tudo muito bem! Mas, se acharem que isso não está bem, pegarei em alguns de meus
Zangões, e partirei com eles para fundar novas Colonias de minha espécie?”
Eu, olhando para as Abelhas e Zangões da minha Colonia de Colmeias, virei-me
solenemente para a Rainha verde e vermelho prateado, - “Continuemos nosso voo,
pois, também eu na ocasião me havia apaixonado por Sua
Majestade...e agora que a temos connosco e precisamos de si, não vamos desistir
de nossas sobrevivências, seja com a criação de uma nova espécie de Abelhas ou
não. Pelo contrário, será para nós uma honra, que
sejamos a partir de agora uma espécie misturada com aquelas que nos
salvaram da morte e da extinção certa. Viva a
Rainha....”...
Nascia assim uma nova espécie de Abelhas. E a partir dali, passava também a
existir, os melhores mel e geleia real que jamais haviam sido produzidos por
qualquer espécie de Abelhas até ali existentes...
Pequena
Estoria alusiva ao Natal, escrita em Luanda, Angola, a 23 de Dezembro de 2014,
por Manuel JFD de Sousa, em Homenagem a todas as Crianças de Angola e do
Planeta Terra e a Paz e a Liberdade dos Povos...
Manuel de Souza
Obrigado meu amigo Manuel de Souza. Hp
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