Há meios onde escasseia a gente de leitura e compreensão, por razões explicáveis. Mas, duro no aceitar, menos e menos se vê um político com substância «sentado» num evento cultural de significado. Alguns cirandam nas plateias tratando-se de «vernissages», lantejoulas, gente vistosa. Os afoitos na política, de partido ou não, são, por regra, mais e mais abúlicos face à cultura, às estéticas, ao ontológico, à essência das coisas, ao Outro. Por vezes, como se a afirmação da menoridade os guinde ao estrelato preferem guerrear as ideias alheias mesmo se delas se apropriam. Limpam os dedos da sardinha assada enquanto as telhas da casa voam, quais notas de casino. Bajulam com as garras dos sorrisos. Deixei de me preocupar em absoluto com estes figurantes de grandes e pequenas produções mesmo se este alheamento me coarcta no dar tanta atenção ao enredo, e, quiçá, ao desempenho dos verdadeiros actores do filme. Até talvez o mundo seja assim há séculos e nós prestemos mais atenção ao terrorismo bombista em desfavor do mais «light», quais falas de comadres, álcool fervendo, intrigas de mulher dama, ministros mosca morta, vidas acima dos bolsos, o corroer das veias nos quotidianos. Amam a estrela polar e hostilizam o mundo. Nesta biodiversidade entram muitos dos melhores.
Preocupam-se com a globalização, um fenómeno natural. Acreditaram no gongorismo e nos hossanas ao futuro dos videntes da nova ordem mundial, passado o nó górdio dos produtos financeiros tóxicos. Viria aí o capitalismo menos selvagem. Esquecem o efeito esclerosante sobre a democracia dos institutos não reciclados, da eternidade das leis. Deleitam-se no caruncho analítico dos medinas carreiras. A fobia do colesterol furta-lhes a erecção ou a líbido. Alain Minc fê-los crerem numa imprensa de jornalistas. Enquanto isso o negócio informativo trepou pela dor, o suicídio, contagioso, vira página de rosto, a seriedade desejável à política é tablóide, vendável, papel ou imagem animada. O estrondo do verniz diplomático incomoda. Tolera-se a hipocrisia dos discursos da «verdade».
Como Galindez, de Montalbán, é fugir a quantos apregoam dizer tudo quanto pensam, não tarda mordem-nos. O sorriso etéreo dos sem casa, inimaginável, o interiorizar da nostalgia de Mandela, «mestre do seu destino, capitão da sua alma», ver o exemplo no tolerante e solidário, ouvir a «nona» na força da humildade, dedicada, em resguardo, é recompensa, mesmo se o caminho mais longo para chegar à cidade.
Henrique Pinto
Novembro 2010
FOTOS: manifestação antiglobalização, Sidney 2002; Montalbán; Nelson Mandela e Graça Machel; Alain Minc
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