Sesimbra é terra de meus pais, é a minha terra. O conjunto
construído pelos ascendentes e colaterais dos ramos genealógicos de meus
progenitores, que ali jazem no cemitério da vila, constitui porventura a maior
família de Sesimbra.
Conhecida como burgo há pelo menos cinco mil anos, ali
desembarcaram e ficaram muitos dos cruzados nórdicos – e logo os cabelos ruivos
e olhos azuis ainda hoje bem dispersos e lindos, ou as aiolas dos pescadores – e, nas
décadas áureas dos descobrimentos portugueses, muitos foram os navios ali construídos.
A prática da construção naval permaneceu viva até ao final dos anos sessenta do século passado.
Quando a «boa» gestão dos primeiros dinheiros europeus começou a produzir
efeitos os pescadores receberam dinheiro para abater os seus barcos de madeira –
e como se esfumam rápido as notas assim ganhas – tal foi meio caminho andado
para desfalecer uma e outra arte de séculos, o advento de tempos árduos.
Mesmo
assim a gastronomia continua essa longeva tradição, a qualidade mais e mais
apurada, e daí a consigna publicitária bem apanhada «Sesimbra é Peixe».
Fiz ali a instrução primária. Aos meus professores, Amável e Elisabete,
tenho-os bem vivos na minha estima. Acho que quase tudo o que me disseram e ensinaram
me é útil ainda hoje, médico, mestre e doutorado. Coisa que hoje seria inimaginável.
Voltei a correr a sacra
profissão laica do Senhor das Chagas, a mais singular das devoções que conheço. Há um descomprometimento cúmplice, os homens do mar - que só se lembram de Santa Bárbara quando troveja - têm-lhe um respeito gigantesco, incluindo os que nunca transpuseram os umbrais duma igreja.
Meus pais estão ali sepultos em lugares donde se avista o mar azul a perder-se no horizonte, e visito-os com muita regularidade. Sinto-me como se estivesse em Delfos meditando a olhar o mar das Oliveiras. Provavelmente há lutos mais rápidos, limpinhos, tradição nalguns países, mas aí a saudade é sempre mais volátil. Ora a saudade consola e é saudável frequentá-la
Meus pais estão ali sepultos em lugares donde se avista o mar azul a perder-se no horizonte, e visito-os com muita regularidade. Sinto-me como se estivesse em Delfos meditando a olhar o mar das Oliveiras. Provavelmente há lutos mais rápidos, limpinhos, tradição nalguns países, mas aí a saudade é sempre mais volátil. Ora a saudade consola e é saudável frequentá-la
16 de Fevereiro 2014
Henrique Pinto
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