A notícia divulgada ontem
sobre ser possível a empresas de informática traçarem perfis psicológicos e
ideológicos com base no estudo dos «Gosto» apostos nos posts do Facebook pouco tem de novidade. Todo o conhecimento médico
e do funcionamento de mente e corpo é feito por análise estatística, mor das
vezes bem mais difícil de interpretar que esta.
Como é possível tal ser
autorizado? – é a pergunta de muitos. Porém, este comportamento é corriqueiro a
todos os níveis desde há um bom tempo. É um jogo de enganos como qualquer
outro.
Se durante a parte maior
de sua vida alguém fez da profissão e cargos um empenho na construção dum
serviço de saúde universal – apesar do exército multicor de detratores -, e, na
altura de se tornar claro que a gestão livresca do reflexo dos recuos da economia,
o atingiu com dureza, não pode ignorar essa ferida em órgão de primeira
importância para o país e para si próprio. Fica chocado ao ouvir o «mentor» de
tal «gestão» dizer sem pudor do Estado Social estar «agora melhor».
Há dezenas de anos, depois
da independência na prática clínica, fiz Bancos de urgência em todos os feriados
relevantes, como Natal, 15 de Agosto, Ano Novo, e fins de semana, durante anos
a fio. Era já difícil conseguir médicos disponíveis em tais dias e, quem
necessitava, em princípio de carreira, aceitava entrar no jogo até por ser bem
pago. Os hospitais sempre deviam ter podido contratar médicos por ajuste direto
para momentos críticos como estes. Obviamente, não é possível consegui-lo
pagando a nove Euros por hora, diretamente ou através de empresas de
recrutamento – aqui com pessoal de saúde, ali com professores de música ou
psicólogos -, absolutamente dispensáveis.
As pessoas influenciáveis pela voz La
Feria no poder deviam pensar um tanto melhor quando se insurgem contra o
pagamento um tanto mais justo a quem faz urgências em saúde, seguramente das
práticas conhecidas por mais desgastantes, tanto mais se os atores deste filme
são pessoas livres de quererem sujeitar-se ou não a tal suplício.
Dir-me-ão ser moralmente
condenável o recurso a atestados para fugir a tais jornadas. Sim, concordo. Tanto
como saber não estar nesse número marginal de supostos fingidores a explicação
para o desacerto.
Não tenho dados suscetíveis de provar serem evitáveis ou não
as mortes devidas ao frio. Aconteceu efetivamente descerem perigosamente as
temperaturas e subir a mortalidade em todo o lado onde tal ocorreu. Não se pode
provar ser minorável o fator tempo nas mortes ocorridas nas esperas em serviços
de urgência. Embora os números nos digam terem havido exageros de pouca
sensatez para quem manda. Contudo, julgo ser inteligente prestar-se a devida atenção
aos sucessivos alertas, honestíssimos e de interesse nacional, lançados pelos
bastonários das carreiras, e particularmente o dos médicos, quanto ao
enviesamento dos financiamentos da saúde. Onde o ministro,
melhor gestor do que
os seus colegas e superiores, faz o que lhe é possível.
Veja-se o caso de Leiria.
O Centro Hospitalar está entre os cinco melhores prestadores de cuidados no
país mas ocupa a 17ª posição na atribuição de recursos humanos especializados.
Como ouvi a um reputado conselheiro de Obama há uns meses em Bruxelas, «o
dinheiro pode não ser muito mas existe nesses países». Um grupo que incluía
Portugal. Mas o objetivo último da política neoliberal é a deliberada destruição
por dentro de tudo o que é público. Que lhes importa o Estado Social ou a TAP?
Pois bem, os estudiosos
das estatísticas do Facebook escusam de se incomodar a catalogar-me. Sou, em
definitivo, contra este rosário de embustes.
Henrique Pinto
Janeiro 2015
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