segunda-feira, 14 de junho de 2010

APESAR DAS RUÍNAS E DA MORTE


Os ecos da revolução americana, com a Declaração de Independência, república e carta, foram debilmente sentidos em Portugal. Muito mais o foram noutras regiões europeias, como as actuais nações Holanda e Suíça, cujos levantamentos internos foram travados pela intervenção de exércitos doutros Estados. Só a Inglaterra lhes ficou relativamente imune, apesar das perdas coloniais, por ser há muito uma monarquia constitucional.
Muito religiosa (quase no limiar do fanatismo), piedosa, culta, inteligente, atenta à população humilde que estimava, educou ela mesma o infante José, para ser rei, e viu-o morrer cedo, com varíola.
Horrorizavam-na os «exageros» do primeiro ministro Pombal, ex embaixador em Inglaterra, sensível ao iluminismo mas porventura dentro do espírito do «absolutismo esclarecido» reinante à época na
Europa. Sobretudo no que à perseguição à família Távora respeitava. Filha terna e dedicada, a princesa sofria com o que lhe era dado saber do envolvimento do pai neste processo. As sucessivas posturas insurgentes dos membros sobreviventes, quanto à restituição dos bens, incomodavam-na até à dor.
A França revolucionária, sobretudo a partir de 1789, e particularmente o ruído das ebulições sanguinárias, a situação da Rainha Maria Antonieta, dados os traços psicóticos já vincados abalaram-na de vez na sua estrutura mental, pelo que foi destituída. E viveu nesse horror 24 anos mais, «apesar das ruínas e da morte» como no verso de Sofia Mello Breyner.
A peça de Miguel Rovisco, A Rainha Louca (cuja protagonista foi encarnada superiormente pela actriz Fernanda Alves no Teatro D. Maria II, em 1987), foi inspirada nesta princesa, depois Rainha D. Maria
I, «mulher enclausurada num mundo de demência e evasão». O texto serviu de base à concepção da ópera do mesmo nome escrita pelo compositor Alexandre Delgado, por encomenda do Teatro Nacional de São Carlos, cuja estreia está aprazada para Julho de 2011 no Centro Cultural de Belém.
A Abertura musical desta ópera, já apresentada pela Orquestra Sinfónica Portuguesa em 2004, então dirigida por Donato Renzetti, reapareceu agora no Festival Música em Leiria na interpretação da Orquestra Gulbenkian, com a batuta de Pedro Neves.
Henrique Pinto
Junho 2010
FOTOS: recriação da Rainha Maria Antonieta, no filme de Kirsten Dunst; Rainha D. Maria II; Marquês de Pombal; Thomas Jefferson, obreiro da revolução americana, redactor da Declaração de Independência, 3º presidente dos EUA; Henrique Pinto com Alexandre Delgado; Revolução Americana, no filme Revolução Levantada, de Hugh Hudson, com Al Pacino; cartaz do 28º Festival Música em Leiria; Abraham Lincoln, o 16º presidente dos EUA, assassinado.

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