terça-feira, 24 de março de 2015

LONGOS DIAS, MUITAS DÉCADAS (I)

1 Kill me later(1)

«Ainda sou do tempo em que você era bestial…». É o bom amigo que, abraçando-me, mo diz ao ouvido. E saiu-me, por brincadeira: «… e agora sou uma besta, não é?».
A empatia tem destas coisas, sorrimos francamente, ambos sabendo que a maledicência paira sempre no ar por mais impoluto ele possa ser.
Sempre saí pelo meu pé donde quer que fosse. Fui invariavelmente louvado pelos meus mestres por estar uns passos adiante dos meus pares. Lembro-me bem de, ao apresentar a minha renúncia, aliás, por demais anunciada e preparada, da liderança cultural, ter deixado escrito «sei com absoluta certeza, mal vire as costas começam a tosar-me à grande e à francesa, em Portugal somos assim, a inveja é consolo da inanição».
Emociona-me o apontar os heróis, os que trabalham, as pessoas de sucesso a expensas suas, pensadores livres, os construtores de catedrais. E faço-o amiúde como dever cívico. Quanto a vilões, desses fale quem quiser!
É, hoje como ontem, algo que me não perturba. É assim mesmo. «Kill me later!».


2 Nóvoa, Castro, coragem

Devem-se a Sampaio da Nóvoa, reitor honorário da universidade de Lisboa, um intelectual do dito centro esquerda, homem da cidadania, a melhor forma de representatividade, palavras corajosas, não circulares, como «Devo a Abril tudo o que sou», (…) «Chegou o tempo da coragem e ação», (…) «esta Europa» quer «esta União 
Económica e Monetária, já não nos servem», (…) a mudança depende de «nós». «Assim como em Abril, temos que ser nós a contribuir para mudar o panorama europeu», sublinhando, «É na Europa que podemos vincar a nossa posição». Os tempos de austeridade são um «desastre», urge acabar com «esta política antes que ela acabe connosco». Proferiu-as há dias num debate sobre a cidadania quando o seu nome é insistentemente referido como possível putativo presidente da República. Tal como o são outros amigos meus, de Oliveira Martins e Paulo Morais a Henrique Neto. Têm fracas sondagens? Que importa isso agora? Fui mandatário distrital duma candidatura independente de quem à partida teve má imprensa e pouco se esperava. Dos 630 mil votos obtidos 100 mil deles foram-no no distrito de Leiria. O bom nome de quantos o emprestaram foi assaz significativo nesse florescimento.
Não se pode ostracizar quem muito fez de boa-fé sem que o dinheiro, por qualquer razão, lhe chegasse para tudo, nem incensar definitivamente quem muito poupou nas finanças desgastadas. Raúl Castro está entre estes últimos num patamar bem elevado de respeitabilidade. Economista de formação, com mais de 25 anos de gestão autárquica, conhecedor, conseguiu esse feito notável dum saneamento financeiro bem custoso. Honra lhe seja feita.

3 Mulher de charme
Por bem conhecida que seja entre o público C e D, e embora o seu charme toque igualmente as elites do social, uma mulher, sobretudo neste país, a lançar uma Revista com o seu próprio nome e lograr vender nas primeiras horas mais de 150 mil exemplares, estando de momento entre as divas de mais forte intervenção, não o
consegue só pelo seu belo «look». Cristina Ferreira, apresentadora, atingiu cedo esse Olimpo. Bonita, sim, mas inteligente, de personalidade vincada e, num relance breve sem equívocos, agradável, workaholic, imparável, perseverante, é, sem a menor dúvida, uma senhora de grande valor. Claro, detesto aqueles produtos que anuncia, sobretudo os horrores alimentares, no programa com o Goucha. Mas não se pode exigir aos sérios e interessantes que sejam igualmente sábios.
(1)    «Matem-me mais tarde», do filme Focus
Henrique Pinto

Março 2015

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