quarta-feira, 5 de maio de 2010

OS TECNOCRATAS INSACIÁVEIS

1 Tão diferentes e tão iguais

Vasco Lourenço é sempre bem-intencionado mesmo quando se passa dos carretos, apocalíptico. Portugal não «precisa doutro 25 de Abril», pá! Precisa é de produzir exemplos que induzam uma certa mudança positiva das mentalidades. E de quem lhe dê confiança, sem messianismos. Confiança é motora de esperança. Exemplaridade positiva é sempre êmbolo de confiança.
Portugal carece dum outro discurso dominante que não o eminentemente tecnocrático da economia ou o do «linguajar e mal dizer em jeito futebolístico», o do «nós e eles», pá!
Cavaco Silva e Francisco Louçã, com diferenças de estilo e de formação, têm o mesmo discurso economista e anti-cultural (no sentido sociológico). São, com toda a certeza, maus motivadores de «futuros», mesmo quando emanam a «confiança» dos números. E quem tem números em alturas de crise dá cartas.

2 As poupanças do feitor

Sem cair na tentação de glosar Medina Carreira ou Paulo Portas, ainda aí não cheguei, pá, apetece-me dar conta, sob o meu ponto de vista, em como o rei vai mal vestidinho. Este discurso lembra-me quem tanto se mexeu para ser erguido o novo Estádio do futebol em Leiria. Aquilo é um monstro inútil, nem na metade está ainda pago. E nenhum dos defensores arcou com qualquer penalização social. Vários deles até foram promovidos. Aviva as novidades do «jovem velho» João Oliveira, deputado comunista, «o mal não é de hoje, é do que a política de direita gastou mal em trinta anos», diz ele. Ora bem lhe podiam lembrar no mesmo estilo «nós e eles», Vasco Gonçalves gastou em três meses a poupança aurífera de décadas do feitor de Santa Comba. Mas isso seria ahistórico.
Agora alguns iluminados antigos ministros das finanças vão a Belém com as mesmas receitas daquele grupo de «gestores» de há meia dúzia de anos!
3 Luís Filipe Vieira vs Pinto da Costa

É necessário construir.
Então, senhores responsáveis políticos, deixem-se de remoques ou «lições» na TV quando se podem encontrar semana a semana. Acertem o passo! Desde sempre se fizeram pactos de interesse comum.
Provavelmente este governo terá tido erros substantivos de governação. Acredito que continue a tê-los. No que eu melhor conheço tem-nos, seguramente. Mas será que a oposição se tem distinguido por alguma virtude nesses mesmos campos? As supostas verdades de cada formação terão muito mais significado que - através da má-língua e do esticar a corda - ganharem pontos no ranking do voto (por mais longe que estejam as eleições)? A contraposição ao estilo Luís Filipe Vieira vs Jorge Pinto da Costa tenta impingir-nos a história do lobo mau, ninguém tem algo a ver com a baixa de hierarquia da economia portuguesa. Como se a infindável campanha interna de descrédito, e mesmo em Bruxelas, sem ascendente ético e de valores, fosse inócua. Os maus parecem ser apenas os especuladores financeiros internacionais, as agências, etc. Não será tempo de governo, presidente da república e oposição terem alguma contenção e concertação tendo em vista a «vitalidade» financeira e a coesão social necessárias para Portugal ser bem sucedido? Ou recuamos 60 anos ao tempo do desprezo pelo Plano Marshall? O argumento macroeconómico dos grandes empreendimentos é nauseante. Interessa ao país que o governo enfraqueça, passe por incumpridor ou «mostre o rabo»? «Há verdades mais verdadeiras que outras», como glosaria Orwell?
Uma juventude portuguesa e europeia fremente de valores como a verdade, a justiça justa, o ambiente saudável, uma vida com emprego e socialmente confortável, procura a confiança perdida. Encontrá-la-á neste universo de «claques» políticas?
4 As elites qualificadas

Tivéssemos uma Lei Eleitoral mais justa (mesmo que imperfeita, apenas aos deuses se exige a perfeição) e, certo e sabido, os eleitos teriam mais consideração por quem os elege.
O Dr. Mário Soares evocou na TV, a propósito das críticas à justiça, «havendo gente muito boa dentro dos seus diversos lobbies certamente o exemplo para uma confluência reformista e organizada podia emergir deles mesmos». Tal e qual o que se pode adiantar quanto aos partidos políticos em Portugal. A linguagem usada nem se adapta aos 65% de iliteracia da nossa população (dados da Assembleia da UNESCO, em Baku), com apenas trinta e poucos anos de democracia em novecentos anos de história. O povo não é tão sectário. E hoje sabe-se, a memória histórica existe.
Tive há uns anos um debate público muito interessante com Pedro Passos Coelho e fiquei bem impressionado. Espero que, independentemente das posições que ele tenha de assumir, preserve essa imagem do discurso prático qualificado.

5 A legislação eleitoral atenta contra a dignidade

É relevante taxar quem tem lucros indecorosos (e é boa parte da administração das grandes instituições bancárias e de serviços, sustentada pelos accionistas, não por todos, tão só por um pequeno núcleo e com cruzamentos entre si, mesmo quando representam também os pequenos investidores). Os ditos «bons» administradores vão-se embora se tal acontecer? E os jovens crânios que mês a mês estão a emigrar por falta de oportunidades, não poderão ser ainda melhores que esses «pobrezinhos»?
Claro, melhor seria se essa taxação emergisse como recomendação das autoridades europeias, a exemplo dos éditos de Obama.
Urge requalificar a população com novas competências, fomentar a literacia do carácter em cooperação com o terceiro sector da economia e reformar finalmente as regras eleitorais. São imperativos morais e éticos. Haverá lobbies dentro de cada partido capazes de pôr as mãos no lume por tais requisitos?

6 Cavaco furtou-se a presidenciais

Que necessidade tem o partido socialista de introduzir mais uma fractura interna (o que tocaria milhares de cidadãos) e no país (no que a todos respeita) apoiando um candidato presidencial, num momento onde as escolhas «mais livres» podem constituir-se como um factor de tranquilidade num país dorido? A voz bonita de Manuel Alegre representa alguma mais-valia nacional? É óbvio que não!
O primeiro-ministro é das pessoas mais violentadas publicamente de sempre no país (seguramente sem justiça). É também pessoa de determinação e coragem invejáveis. Mas mesmo previsivelmente isento de responsabilidade nestas cabalas está socialmente fragilizado. Ao país só interessa que se inverta o sentido desta fragilidade. Será de facto coragem expor-se agora ainda mais em eleições presidenciais – Cavaco Silva fugiu disso em 1991 – com os riscos de imagem que o país sofre e que uma tal refrega pode acarretar? Será a presidência o maior dos «factores críticos de êxito» de Portugal? Não é!
7 Vende

A política qual prática social, tal como está, esvaída do pendor cultural, da ética, da consideração pelas pessoas que trabalham e/ou pelas que pouco exercitaram as suas verdadeiras capacidades (um dado incontornável da medicina), da solidariedade e mundividência, pouco mais vale que os estudos dos jornais A Bola ou O Record, entre outros. Nada edifica. Apenas vende.
Henrique Pinto
Maio 2010
FOTOS: Cavaco Silva (caricatura KAOS); Francisco Louçã (Caricatura KAOS); Luís Filipe Vieira e Quique Flores (caricatura); os nossos parlamentares (caricatura); Pedro Passos Coelho; Manuel Alegre (caricatura); António Varela, Henrique Pinto e Fernando Nobre; Mulheres, pintura de Jeroen Buitman, Loulé, Algarve, 2010 (in Algarve Goodlife Magazine)

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