quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

A CAIXA DE FÓSFOROS, Conto de Maria da Graça

Um dia em Coimbra, já passaram quarenta anos, lemos um artigo do Mário Castrim; dizia ele - Um cinema não é uma caixa de fósforos! Lá está o Castrim e as suas Castrinices! Que ideia!
Fartámo-nos de rir, tínhamos os dentes quase todos e achámos muita graça. Eramos novos mas não envelhecemos assim tanto passado este tempo.
Lembro-me a primeira vez que vi cinema; foi em casa das Eduardas, devia ter cinco ou seis anos. Um dos irmãos tinha a mania das engenhocas e então tinha uma máquina de projetar que fazia barulho ao rodar o filme e que de vez em quando partia a fita, mas foi um deslumbramento ver o Bucha e Estica  e todo o movimento envolvido. Eu muito pequena, a sala de jantar parecia-me enorme.
Depois vi muita vez filmes; de verão no campo sala ampla com teto de estrelas e às vezes de chuva que nos obrigava a abrigar debaixo das árvores, mas ninguém desistia. 
Quando não tinha idade para entrar minha avó ficava comigo cá fora e eu e outros espreitando entre as árvores víamos o cinema com as legendas ao contrário. Tal era a vontade.
De inverno cinema no convento sala mais estreita em que o cinema escope ficava saído dos lados, noutro plano, ou então na garagem das camionetes da carreira.
Quando não tinha idade o Sr. Magano enfiava a mim e à filha na cabine de projeção, pois ele pelava-se para cumprir regras.
De qualquer modo havia os banco corridos à frente mais baratos, com os rapazes fazendo comentários ao filme e ao desempenho da máquina do Sr. Magano, que apesar de ser duma boa marca, mas na ausência de técnicos capazes e dos trompaços que levava  nas voltas à ilha, foi-se desgastando.
Cá atrás havia as cadeiras mais caras e onde era figura habitual o Dr. Pita sempre atento e de piada fina.
Quando estava no Colégio vimos em sessão especial para as meninas os Filmes Históricos no cinema Sporting da Horta.
Sem esquecer uma recomendação: quando a cena for de beijos, olhar para o chão.
Esses mesmos filmes agora fazem-nos chorar de tão importantes que foram, para a nossa idade.
Depois em Coimbra, sala agradável, cheia, forrada a madeira, e onde vimos tantos documentários do regime anterior, sem esquecer as habituais piadas de algum engraçado, que quebrava a tensão nas cenas mais chocantes ou de maior tensão nos filmes.
Mas havia o documentário que preparava a mente para o filme e muitas vezes era instrutivo ou libertador.
Sempre estes espaços me pareceram grandes.
Sem querer ser destrutiva nesta matéria até porque continuas a gostar muito de ir ao cinema o que é louvável, hoje digo-te: um cinema pode ser uma caixa de fósforos!
Salas labirínticas, escuras, enfiadas em centros comerciais, com som altíssimo, preto à volta, comendo pipocas, sem documentários, sem se perceber bem se o filme acabou. Tudo me parece pequeno nestas salas e só me apetecia ouvir o Dr. Pita - Boa música, bons cenários....
Maria da Graça
Natal 2013

(Um Conto de Natal para mim)

Fotos: Veneza, 1994; Hollywood, 1979; casa (2); Leiria 2002

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