Não importa o fuso horário (1)
Se tivesse 20 anos provavelmente teria reprovado o exame de
admissão para entrar médico na América. Mas aos cinquenta anos safei-me muito
bem, tanto no exame de Paris como na entrevista telefonica a partir de Andorra,
onde a família esquiava. Aos diretores de então do CDC, Centers for Diseases Control and Prevention, do governo dos EUA, de
Chris Morgan a Viginia Sweezy, meus bons amigos, ou ao meu colega Bruce Ailward
da OMS, devo a confiança que depositaram em mim, os conhecimentos que me
transmitiram, as pessoas maravilhosas que me permitiram conhecer, e as missões
que me atribuíram, sobretudo na África profunda. Parti para os EUA na madrugada
seguinte ao casamento dos meus queridos sobrinhos.
Se as pessoas
em Leiria me conotam com o Orfeão, se nos primeiros tempos da Saúde, depois de
Londres, me identificavam pela Estatística e o Planeamento, em Rotary e nestes
organismos passei a ser o senhor Poliomielite, tal o apelo e a extensão da praxis que me foi rogada.
Amigos, em todos estes momentos de labor diverso há uma entidade
constante, prática simultânea, uma participação ininterrupta, o OLCA. Conversei
com a colaboradora Gracinda Moniz, minha boa amiga, em termos de gestão, em
quase todos os dias, estivesse onde quer que estivesse, não importando o fuso
horário.
A gestão não tem de ser por regra uma atitude presencial sobretudo
quando se podem fruir as equipas maravilhosas que eu escolhi. Aos seus
componentes dedicarei sempre o meu ilimitado reconhecimento.
Um novelo
complexo (2)
Pois bem, agora há quase quatro anos que eu vinha preparando a
minha saída de presidente da direção do OLCA, sem que tal interferisse no fazer
e querer fazer cada vez mais e melhor.
A organização cresceu de tal modo nestes quase 31 anos que levava
de presidência – as dezenas de frentes internas, a complexidade organizativa,
imensas chefias intermédias desde maestros a diretores pedagógicos e
artísticos, da música à dança, dos Encontros Internacionais a Música em Leiria,
e muito mais -, que os recursos humanos necessários, atingindo largas
dezenas,
e as fontes e modalidades de financiamento, tão intensamente díspares, enformam
hoje um novelo complexo. Por estas e outras razões, este conjunto «empresarial»
do terceiro ou já mesmo do quarto sector, do associativismo cultural, é,
seguramente, de gestão mais árdua que a generalidade das empresas ou até de
algumas autarquias da região.
Só estas razões justificariam redobrados cuidados na transição
duma direção para outra. Claro que os elencos vão sempre a votos. Mas aqui não
há secretários gerais ou diretores executivos profissionais que assegurem a
transição do conhecimento e da experiência, e particularmente na diplomacia da
cultura e no relacionamento informal.
Foi assim curial esperar (e agir para
o lograr), pela pessoa que tivemos por
certa, e depois fazer-se um ensinamento exaustivo, prático, livre, profundo,
longo, para que ficasse plena conhecedora e em condições de assegurar a
liderança. E ir a votos, obviamente, nas melhores condições de
entrosamento.
Porquanto qualquer direção desta casa tem de ser uma aposta com futuro e não um
fruto conjuntural ou do acaso. A minha escolha, secundada profissionalmente por
um apoio incondicional de amigos do peito, recaiu no senhor arquiteto Carlos
Vitorino, à altura vereador da Câmara de Leiria, a quem auguro um imenso
sucesso como Presidente do Orfeão de Leiria.
Os atores
(3)
Por mim irei agora dedicar-me inteiramente à minha profissão de
médico e ao ensino, com a consciência de ter construído um paradigma cultural
com o contributo dessas equipas fabulosas a que, nunca é excessivo dizê-lo,
estou francamente reconhecido.
Tenho a consciência plena que neste percurso de quase 31 anos no
OLCA se partiu dum ponto organizativo, lúdico e de serviço muitíssimo baixo,
embora enxertado numa tradição notável, ainda que descontínua, para se atingir
a maturidade e o prestígio, logrados uma e outro dentro e fora do país, a que
assistimos nos últimos anos, e que é algo singular em Portugal.
Tenho a consciência absoluta que esta Obra foi conseguida com o
contributo e o esforço de muitos, dentro da casa e, de forma substantiva, fora
dela, no ambiente social, cultural, educativo e político regional e nacional.
Mas é incontornável que a sua longeva sustentabilidade assenta no empenho e
persistência dum escol muito restrito de empreendedores.
Gerir o fenómeno cultural implica que os atores do processo, para
além da competência, sejam pessoas cultas e de espírito mais maleável que os
meros tecnocratas. Tenha-se em conta o fato de o resultado último interferir
fortemente com o social.
Todavia, a poucos servirá a prática cultural intensa se ela
definhar intramuros, se não se tornar num farol para a comunidade alargada.
Isso só pode depender doutro esforço de equipa, o da comunicação e imagem
reprodutoras de valores, preferencialmente em outsourcing, e profissionalizado,
pela vastidão de bites. Tive
sempre esse apoio qualificado.
Ao Dr. António Laranjeira, meu bom amigo desde
sempre, e às suas equipas na Midlandcom, estarei para sempre muito grato.
Cheguei a dizer em várias entrevistas na comunicação social, e,
mesmo diretamente, a muitos putativos mecenas, «ser um pedinte profissional com
cartão do sindicato dos pedintes».
A dada altura, marcada uma reunião com o então secretário de
Estado da Educação Dr. Oliveira Martins, hoje presidente do Tribunal de Contas
mas também do Centro Nacional de Cultura (sucedeu aí a essa grande amiga minha,
Maria Helena Vaz da Silva), a pessoa que acabastes de ouvir na simpatiquíssima
mensagem em vídeo que me dirigiu, um bom amigo, era
anto o calor naquela saleta de espera
exígua do ministério e tais os nervos e a sede a atormentarem-me, que tive um
apagão. Acorreram todas as secretárias e mesmo o governante, sei lá quantos
copos de água e almofadas ali chegaram, levaram-me na horizontal para o sofá
longo do gabinete oficial, foi uma roda viva! Digo-vos, sem ter sido
propositado, afinal, também nunca consegui um apoio financeiro tão rapidamente,
125 mil Euros que deram para os últimos retoques no edifício novo do OLCA.
Bendito apagão.
Ora, tal cometimento e outros só foram possíveis pelo
envolvimento, admiração e respeito conseguidos junto dos setores da economia
público e privado, com a ênfase no empresariado nacional e regional, e juto de
todos os governos. Porquanto sempre considerei estrategicamente fundamental que
as empresas em sentido lato se envolvam na educação e na cultura.
Henrique Pinto
29 de Novembro de 2013
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