Já não estamos em tempo de
ir à bruxa. É altura de nos confiarmos à medicina baseada em provas, a maior
afirmação dos últimos trinta anos. E mesmo a esta urge fazê-lo com cautela.
Infelizmente o país está entregue
às multinacionais das dietas franchisadas, dos drenantes, dos suplementos, das
inutilidades perigosas. Para maior confusão e tristeza, boa parte das farmácias
está de momento a salto por parte destas empresas de grande porte, cujos
produtos se incluem num mercado que, em Portugal, ninguém controla. Algumas das
pessoas a exercerem o papel de nutricionistas nestas farmácias e outros estabelecimentos
sê-lo-ão mesmo por formação. Mas só aceita um lugar destes – para vender
produtos supostamente deletérios -, quem está na difícil posição de desemprego.
O que aprende na Faculdade nada tem a ver com tal prática. Mas a maioria destes
trabalhadores tampouco são nutricionistas ou dietistas. Têm as formações mais
afastadas da saúde que imaginar se possa, até engenheiros e administrativos. Só
é preciso terem lábia suficiente. E são pagos por estas empresas da dieta
inútil e, por regra, o cliente nada paga pela «consulta» ou gasta uma ninharia.
Só é preciso que compre os produtos.
Obviamente que alguém
qualificado tem vergonha de fruir uma concorrência desta natureza. E quem manda
não a terá?
Um país empobrecido a
martelo para «se tornar mais competitivo» na visão neoliberal (a dívida e a
imposição europeia eram fatores de menor importância que este pendor da
formação política, agora até o Professor Marcelo Rebelo o reconhece), fica
também à mercê de tudo. Num país onde a justiça se avalia por concentrações
estruturais, duma justiça a redimir-se no circo, como se este não fosse mais um
corrosivo a debilita-la, pouco mais há a esperar em termos de boas práticas.
Livrámo-nos por ora da
Legionella. No mundo foi o terceiro maior surto em extensão na história da
doença. O neoliberal mor sente-se ofendido por dizer-se também aqui haver
culpas do governo. Fosse o seu ar ofendido o problema maior e estaríamos todos
descansados. Pena é competir a um dos ora ministros mais competentes tutelar o
ambiente. Porquanto terá de dizer-se, fosse cumprida a regulamentação de
vigilância e tal surto jamais teria assumido estas proporções. Agora competirá a
esta Justiça trânsfuga, de someninhos, equacionar o quanto vale uma vida (e
foram dez que se perderam) e o quão importante é para a «economia» do país não
incomodar estes produtores de veneno, espalhados por toda a parte, de hospitais
a hotéis e grandes repartições públicas e privadas.
Sei o quanto me custou,
pessoal e profissionalmente, mandar encerrar um edifício da Segurança Social
por «doença» semelhante nos seus efeitos!
Não tenho dúvidas sobre a
honorabilidade do senhor Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos ou da senhora Bastonária
da Ordem dos Nutricionistas (e dietistas!). Estou convencido mesmo que, em face
dos seus discursos de intenções, não deixarão de questionar esta prática nociva
para a saúde e bem estar dos portugueses. Dado tutelarem organismos cujo
princípio mor é o da ética profissional (e não o do lucro de tais produtores),
serão as únicas entidades credíveis para obstarem a este logro nacional. O
ministro referido já pôs no terreno, célere e eficazmente, algumas medidas
potencialmente dissuasoras.
Se os Bastonários o
fizerem, sei o quanto lhes custará, pessoal e profissionalmente.
Henrique Pinto
Novembro 2014
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