As gravuras de Foz Côa – votadas à ignorância e ao desdém depois da petulância e do exacerbado novo-riquismo, como é corriqueiro acontecer a qualquer desígnio cultural de potencial estruturante –, são um testemunho nosso dos mais idosos de formas de comunicação. Quem sabe se a aprendizagem da música – tal como a matemática um dos maiores inventos do homem – no debutar do ensino básico, não poderá vir a ser o mais recente e igualmente belo desses sinais!?
Como o cavaleiro de Termópilas ou os mensageiros da caixa postal, a impressora de Gutemberg ou o sistema Galileu e os telemóveis mais recentes, aqueles sinais são também modelos de informar, que é um subtipo da comunicação. Por franco paradoxo que se nos afigure, comunicar e informar, com o ar cândido da liberdade e do pensamento autónomo, têm sido também, em todos os tempos, grilhetas de opressão, de verdades distorcidas e de intolerância.
No dia imediato ao do terramoto de 1906 na cidade de São Francisco os jornais que partiam para o leste apenas falavam do monumental incêndio, a consequência do abalo. Coisa que o homem podia controlar. E dias mais tarde todas as fotografias impressas eram retocadas. Os negócios nunca estariam à mercê do indomável. De poucos anos mais tarde existem fotos de Trotsky a discursar ao lado de Estaline e outras do mesmo acontecimento em que aquela personagem foi apagada. Quantos cristãos místicos terão sido imolados pelas inquisições medievais diversas? Hollywood dos tempos áureos deu da América uma imagem transfigurada que só alguns media não americanos e a Internet (mesmo com todo o peso da pornografia a quase sufocá-la), para os cidadãos daquele país, conseguiram em parte restabelecer, nestes dias inquietantes que se seguiram ao terror do 11 de Setembro. A literatura concorreu com o cinema para erguer outros tantos mitos. Isabel Allende relata-nos a corrida ao ouro na Califórnia como se os chilenos dominassem o mundo em 1840. Assemelha-se um tudo-nada à historiografia das descobertas de quinhentos. Já existiam cartas de marinhagem com alguns dos territórios então alcançados.
Quão errado estava Alain Minc há meia dúzia de anos ao augurar uma informação de jornalistas? A censura não é instrumental apenas nos climas sociais de suprema intolerância. A concentração de jornais, rádios e televisões nas mãos duns tantos grupos económicos produz um efeito muito próximo, mesmo nas democracias orgânicas enraizadas. As previsões de Orwell para 1994 são hoje risíveis face à vulgaridade das escutas telefónicas aos cidadãos mais impolutos, à incompreensão religiosa, às desculpas para o uso indiscriminado de armamentos poderosos, ao jugo do tráfico de alucinatórios, à justiça injusta.
Todavia, em todos os momentos da existência humana, a arte, a escrita, a religião, a filosofia e a ciência, foram hossanas ao amor, alfaias de recriação e estímulo dos espíritos, de conforto dos cépticos e de alerta para a exaltação desprevenida.
Na escola primária dos anos cinquenta, quando morriam mais de cinquenta crianças em cada mil nascimentos, vergávamo-nos ao peso dos habitantes do planeta, a roçar os dois biliões. Hoje, quando é banal pôr um GPS no cão ou no gato, essa cifra está próxima dos sete biliões. E os fanatismos, cuja memória é secular e se alimentam sobremaneira na cultura da informação, extremam-se perigosamente a um ritmo de crescimento mais célere.
Saudavelmente há uma juventude imensa avessa à mentira e que comunica exaustiva e transversalmente os seus ideais de autonomia, de futuro. Os matizes de associativismo não tradicional, mesmo com exageros por excesso e por defeito, na defesa de causas tão diversas quanto a preservação de espécies, as diligências para a paz ou a liberdade individual, multiplicam-se sem cessar. Quando a ética nos negócios, na política e na informação, passa por crivos tão lassos, há sempre um bom exemplo, aqui ou ali, a olear a mecânica do optimismo e que a muitos inspira. Seja na beleza dum poema estampado numa T-Shirt, na personalidade dum bispo resistente, nas ondas da RFM com Oceano Pacífico, numa canção do Ipod, na generosidade de afortunados como Bill Gates, Ted Turner, Mia Farrow, Shakira ou Angelina Jolie, nos gestos duma qualquer movimentação pela paz, em duas palavras que aproximem quaisquer diferenças. E os lobos de ontem podem vezes sem conta ser os cordeiros de amanhã.
Henrique Pinto
Como o cavaleiro de Termópilas ou os mensageiros da caixa postal, a impressora de Gutemberg ou o sistema Galileu e os telemóveis mais recentes, aqueles sinais são também modelos de informar, que é um subtipo da comunicação. Por franco paradoxo que se nos afigure, comunicar e informar, com o ar cândido da liberdade e do pensamento autónomo, têm sido também, em todos os tempos, grilhetas de opressão, de verdades distorcidas e de intolerância.
No dia imediato ao do terramoto de 1906 na cidade de São Francisco os jornais que partiam para o leste apenas falavam do monumental incêndio, a consequência do abalo. Coisa que o homem podia controlar. E dias mais tarde todas as fotografias impressas eram retocadas. Os negócios nunca estariam à mercê do indomável. De poucos anos mais tarde existem fotos de Trotsky a discursar ao lado de Estaline e outras do mesmo acontecimento em que aquela personagem foi apagada. Quantos cristãos místicos terão sido imolados pelas inquisições medievais diversas? Hollywood dos tempos áureos deu da América uma imagem transfigurada que só alguns media não americanos e a Internet (mesmo com todo o peso da pornografia a quase sufocá-la), para os cidadãos daquele país, conseguiram em parte restabelecer, nestes dias inquietantes que se seguiram ao terror do 11 de Setembro. A literatura concorreu com o cinema para erguer outros tantos mitos. Isabel Allende relata-nos a corrida ao ouro na Califórnia como se os chilenos dominassem o mundo em 1840. Assemelha-se um tudo-nada à historiografia das descobertas de quinhentos. Já existiam cartas de marinhagem com alguns dos territórios então alcançados.
Quão errado estava Alain Minc há meia dúzia de anos ao augurar uma informação de jornalistas? A censura não é instrumental apenas nos climas sociais de suprema intolerância. A concentração de jornais, rádios e televisões nas mãos duns tantos grupos económicos produz um efeito muito próximo, mesmo nas democracias orgânicas enraizadas. As previsões de Orwell para 1994 são hoje risíveis face à vulgaridade das escutas telefónicas aos cidadãos mais impolutos, à incompreensão religiosa, às desculpas para o uso indiscriminado de armamentos poderosos, ao jugo do tráfico de alucinatórios, à justiça injusta.
Todavia, em todos os momentos da existência humana, a arte, a escrita, a religião, a filosofia e a ciência, foram hossanas ao amor, alfaias de recriação e estímulo dos espíritos, de conforto dos cépticos e de alerta para a exaltação desprevenida.
Na escola primária dos anos cinquenta, quando morriam mais de cinquenta crianças em cada mil nascimentos, vergávamo-nos ao peso dos habitantes do planeta, a roçar os dois biliões. Hoje, quando é banal pôr um GPS no cão ou no gato, essa cifra está próxima dos sete biliões. E os fanatismos, cuja memória é secular e se alimentam sobremaneira na cultura da informação, extremam-se perigosamente a um ritmo de crescimento mais célere.
Saudavelmente há uma juventude imensa avessa à mentira e que comunica exaustiva e transversalmente os seus ideais de autonomia, de futuro. Os matizes de associativismo não tradicional, mesmo com exageros por excesso e por defeito, na defesa de causas tão diversas quanto a preservação de espécies, as diligências para a paz ou a liberdade individual, multiplicam-se sem cessar. Quando a ética nos negócios, na política e na informação, passa por crivos tão lassos, há sempre um bom exemplo, aqui ou ali, a olear a mecânica do optimismo e que a muitos inspira. Seja na beleza dum poema estampado numa T-Shirt, na personalidade dum bispo resistente, nas ondas da RFM com Oceano Pacífico, numa canção do Ipod, na generosidade de afortunados como Bill Gates, Ted Turner, Mia Farrow, Shakira ou Angelina Jolie, nos gestos duma qualquer movimentação pela paz, em duas palavras que aproximem quaisquer diferenças. E os lobos de ontem podem vezes sem conta ser os cordeiros de amanhã.
Henrique Pinto
In Região de Leiria 09
FOTO: A bela cantora colombiana, que tão bem fala um Português escorreito, Shakira, Embaixadora de Boa Vontade do UNICEF, criadora da ONG Pies Descalzos, para promover a alfabetização infantil na Colômbia
Muito produzes
ResponderEliminarEste texto é muito denso, talvez de urânio ou titânio,tenho de meditar para o comentar antes que o meu cérebro expluda.
ResponderEliminarDá vontade de enviar este 'post' para a equipa de redacção dos programas noticiários da TVI. Fazia a minha boa acção do dia, e com sorte eles aprendiam a diferença entre 'comunicar' e 'informar'.
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