quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

OS BÓRGIAS ESTÃO POR TODA A PARTE

Vale a pena ver a série de Neil Jordan «Os Bórgias» no canal AXN. Porque há muito a tendência para generalizar. Ou porque ontem foi assim, há-de ser igual pela eternidade. Vós fizestes o mesmo, vulgata dos partidos. Muitos crêem, lá porque é suposto a organização ser solidária, então todos os membros serão uns anjos. E a vida não é assim. A degenerescência das organizações, burocrática ou nos princípios, é algo que surge com o tempo, a desatenção, a ignorância, a crença cega… Um chico-esperto qualquer (licenciado é ainda melhor, o traje é menos notado, e em nada diverge dos envolvidos na «caixa de robalos») rapidamente cilindra tudo e todos e se torna o dono de quaisquer verdades ou o caluniador de quantos o ajudaram quando ainda passava por «santinho». Se pode pagar a sua prática ficará mais ágil. Claro, em Os Bórgias, cardeal ou diácono não escapava ao veneno, ao descrédito ou à degola. Na política menoriza-se a democracia. Nas instituições de serviço, por vetustas e amplas que sejam, usa-se ainda o mesmo descrédito, ou, usurpando a herança estalinista, sempre eficaz, rotula-se fulano ou sicrano de doente mental e pronto. Karadzic também era médico, psiquiatra e poeta famoso…
Mário Puzo já escrevera Os Bórgia (que não chegou a terminar). Como se pode ler em Insights Literários, «apesar do subtítulo do livro ("A história da primeira grande família do crime"), sugerir que a família Bórgia era perigosa e a primeira grande criminosa, tenho que discordar. Naquela época (não só, claro) era "cobra engolindo cobra", e envenenamentos, conspirações e traições eram métodos comuns para garantir o poder. Todas as famílias, tanto da Itália quanto do resto da Europa, tinham seus (muitos) podres para que sua supremacia fosse garantida».
Quer isto dizer que temos sempre de contextualizar. O que não desaconselha o olhar perscrutador, o espírito crítico ou o abusar da ingenuidade analítica.
Recriando o poema de Manuel Alegre sobre um argentino famoso, Os Bórgias estão por toda a parte. E mais, vivem em qualquer tempo e sob qualquer sigla ou vestimenta.
Esta primeira fase da série televisiva é escorreita, não especulativa, não segue Puzo por inteiro e tem a interpretação sóbria e expressiva de muitos mas sobretudo de Jeremy Irons em o Papa Rodrigo Bórgia que contactou Maquiavel e Leonardo da Vinci. Vale a pena fruir este entretenimento de qualidade. E pensar.

Henrique Pinto

Dezembro 2011

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