quinta-feira, 10 de setembro de 2009

ZERO-CINCO, PARÂMETROS COGNITIVOS (3)



(…) As observações efectuadas revelam desenvolvimentos nas crianças referentes a alguns parâmetros cognitivos como: a crescente distinção, exemplificação, comparação e identificação de timbres, alturas, andamentos; o agrupar e comparar sons, a capacidade de demonstração e a explicação de situações musicais várias, a expressão oral de comentários, etc. De notar, é a capacidade das crianças em relembrar as visitas dos músicos nas sessões do projecto (tuba, oboé, fagote, violoncelo, clarinete, violino, trombone, etc.). A atenção demonstrada durante a sua presença é impressionante, independentemente das idades.
Ilari (2004) investigou o efeito das preferências das crianças e a relação com a memória a longo prazo para duas peças contrastantes musicalmente. Verificaram que bebés com oito meses e meio distinguiam as duas peças quando interpretadas por uma orquestra e distinguiam os timbres do piano e da orquestra. IIari (2004) concluiu que as crianças conseguem codificar e relembrar peças musicais complexas durante pelo menos duas semanas.
Muito do repertório de canções, rimas, chants, utilizado nas sessões, muitas vezes é de originais e criados especificamente para fins específicos e integra conteúdos e conceitos de outras áreas do saber, como por exemplo contagens de números, formas, cores, tamanhos, a aprendizagem de vocabulário, inglês, conhecimento do mundo, etc. Os próprios materiais e instrumentos musicais do projecto são eles mesmos integradores de vários saberes transversais, como é o caso dos instrumentos de pele com formas geométricas e cores diferentes, explorados não só ritmicamente mas também pelas suas características de forma, cor e tamanho. Estes conceitos, bem como a relação entre tamanho e altura de som, são explorados com a utilização dos «boomwhakers», de tubos que encolhem e esticam emitindo os respectivos sons, de tubos para movimento que realizam sons de fundamental, terceira, quinta, etc.
Através de actividades musicais essencialmente lúdicas, as crianças descobrem em grupo, com os seus pares e familiares e aprendem a relacionar muitos conceitos interdisciplinares o que incentiva a existência da transferência de capacidades cognitivas do efeito da participação desde cedo em actividades musicais, particularmente nas capacidades espacio-temporais e de pensamento lógico (Leng, Shaw, & Wright 1990, Rauscher, Shaw, Levine, Wright, Dennis & Newcombe 1997).
A este respeito são de considerar ainda estudos desenvolvidos por exemplo em 2000 por Bilhartz, Bruhn e Olsen que, num grupo de crianças entre os 4 e os 6 anos, reuniram evidencias para concluir que existe uma relação positiva entre uma participação activa em actividades musicais estruturadas e a inteligência.
Glover and Ward (1993) descrevem a relação entre a música e a matemática no contexto do 1º ciclo do ensino básico. Sugerem que essa relação assenta na forma como «abstract concepts like numbers become audible», nomeadamente em actividades musicais que integrem contagens, ordenação, procura de padrões, processos mentais comuns no desenvolvimento do pensamento matemático. Existe de facto essa possibilidade, explorada no projecto Zero/Cinco. No entanto, Edelson and Johnson (2003) lembram que os educadores de infância há muito trabalham de forma interdisciplinar, sendo que a combinação entre a música e a matemática poderia ser reforçada. (…)
(Continua abaixo)

Sandrine Milhano

Extracto de Projecto Zero/Cinco – algumas reflexões

FOTO: Sandrine Milhano

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