quarta-feira, 10 de junho de 2015

DEIXEM ENRIQUECER UNS TANTOS!

Ouviam-se amplamente os acordes do hino pátrio com a banda desfasada da voz de Elizabete Matos, das grandes sopranos do mundo. Acontece. Sobreposto a este evento nobre o repórter televisivo, com uma falsa postura de menino de coro, falava alto e bom som num direto. Estupidez mesmo, não é?
Vi condecorado o senhor Mexia – não lhe invejo o ordenado, a emparceirar com o de Jorge Jesus – e apenas me lembro, governa um monopólio onde se praticam preços descomunais, e, ao cliente, invariavelmente maltratado, retira toda a razão. Estas distrações, por parte de quem condecora ou é assim alvo de homenagem, têm um significado político muito feio.
Disse-me um dia um bom amigo, gestor dum dos melhores Lares de Seniores do país, de preços acessíveis, «dou instruções para os técnicos tratarem cada um dos residentes pelo seu título académico». Inteligência e bom senso. Sabe ser o contrário uma despersonalização, e no caso vertente, a não menorização do utente com uma vida longa.
Ouvi a um ilustre magistrado português ser típico da magistratura em geral suprimir a todos os cidadãos arguidos (incluindo quantos nem culpa formada têm) o tratamento por senhor juiz, senhor doutor, senhor padre. Ou seja, nem Orwell foi tão longe! Deixa de haver pessoas concretas.
Claro, isto também é moda. E não me refiro à tipificação pós-moderna para não ouvir a risada amiga do Joaquim Vieira. Embora o seja. Este estalinismo rejuvenescido é originário dos cursos de gestão de recursos humanos daquele instituto superior cujo diretor se arvora em escriba ultraliberal. De lá se podem ler também das piores teses de mestrado do mundo cosmopolita. Veja-se bem quanto tais polos opostos se assemelham.
O reflexo está no comportamento dos trabalhadores mais novos duma enorme panóplia das grandes empresas portuguesas, privadas ou ainda não, de suposto serviço público.
O rapaz que muito prometeu e a tudo faltou, uma questão de mito urbano como refere (tão arrependido está a ponto de só ver dependurados em braços alheios «sacos de promessas», afligido com o cheiro de «bacalhau a pataco» da Rua do Arsenal), enveredou por uma rota ultraliberal. Fruto disso privatizou a esmo, à custa do meu e doutros bolsos, para, no limite, lograrmos tão péssimo tratamento como utilizadores.
Volto a Orwell, «todos são iguais», não é? «Mas há uns mais iguais que outros». O ultraliberalismo sempre conduziu os países, com prazos diferentes, a populações de apenas dois patamares, muitos pobres e não muito ricos. Um dos líderes chineses de há uma década dizia mesmo dentro do partido, «deixem enriquecer uns tantos».
Leiria, Junho de 2015

Henrique Pinto

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