domingo, 22 de novembro de 2009

O DIA DO FUTURO

Quando frequentei o Liceu Nacional de Oeiras nos anos sessenta éramos para cima de 4000 alunos, raparigas de manhã e rapazes à tarde. Com o passar dos tempos as escolas secundárias passaram a ter à volta dos mil alunos, ou menos.
A Associação Orfeão de Leiria Conservatório de Artes (OL CA) tem hoje responsabilidade educativa sobre mais de 4000 educandos na música e dança, em todas as idades, sem discriminação de sexos.
Todavia, a questão do género não é a mais significativa entre estas duas realidades.
No essencial, dada a obrigatoriedade do ensino e a melhoria substantiva da qualidade de vida, as famílias, normalmente, procuram o ensino regular. As excepções são cada vez menos.
Mas se a prática duma vertente de ensino como a artística não é obrigatória, então a sua procura faz-se por razões culturais e sociais das famílias. Para atingir um gradiente assim expressivo de aprendizes, como o de Leiria, porventura o maior da Europa, significa existirem esses pressupostos, e, cumulativamente, haver um caminho de formação de público, uma postura socialmente proactiva de sedução pela arte, com algum relevo. A escola tradicional não carece desse trabalho de construção social para condicionar a procura.
Um factor comum com significado é do bom ou mau desempenho poderem advir resultados simétricos, internos e externos, em qualquer dos modelos, particularmente se as famílias têm possibilidades de opção para colocar os seus filhos.
O ministério da educação ainda não está em boa posição negocial com as suas escolas. Se o ensino artístico, além das razões citadas, também depende em crescendo da articulação com o ensino regular, não é fácil compaginar estas duas posturas de captação de alunos. Na diplomacia proficiente deste bom entendimento está o futuro da democratização do acesso ao ensino artístico em Portugal no futuro mais chegado. Diplomacia da cultura, bom relacionamento pessoal e institucional, prestígio do ensino e potenciação emergente do interesse autárquico, jogam um papel muito determinante neste sucesso de fazer futuros.
Isso mesmo ficou claríssimo na Abertura Solene do Ano Lectivo no OLCA em dia de Santa Cecília, inspiradora dos músicos. Um concerto de oito horas culminou com o Coro do Jardim Infantil João de Deus, meia centena de radiantes promessas de bons ouvintes e cantores. Desde a manhã um cortejo luminoso, espectro aberto de intervenções, grupos, solistas, coros e orquestras, bailado e música popular, iluminou os espíritos. A anteceder os meninos e meninas convidados, a sessão solene exultou no discurso sócio político pragmático e qualificado, o do novo vereador da cultura e educação de Leiria, Dr. Gonçalo Lopes, e na belíssima Oração de Sapiência, proferida com humor, do Professor Doutor Jorge Arroteia, catedrático da Universidade de Aveiro, alusiva a D. Dinis, rei poeta a exemplo do seu avô, Afonso X. Para exortação da criatividade melhor motivo não é fácil conceber com ascendente sobre a bem elaborada história do semeador! Talvez rarei melhor lição que esta para validar a ideia de a estrutura burocrática e legislativa só arduamente acompanhar o processo voluntarista da sementeira, faltando-lhe pois, em absoluto, o direito de coarctar as colheitas sociais a quem plantou. O que nos remete para uma peroração mais exaustiva e premente.
Bem hajam pois os obreiros deste Dia de Santa Cecília em Leiria.
Henrique Pinto
Novembro 09
FOTO: imagem de Santa Cecília, padroeira dos músicos

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