sexta-feira, 28 de agosto de 2009

GENTE CÍNICA


Quando se ouvem referências a um filantropo considerável o mais certo é alguém adiantar que o indivíduo consegue bons ganhos materiais nessa prática. Este descrédito em relação às boas intenções alheias tem raízes populares, quais marcas seculares obscurantistas, uma alfabetização tardia, a iliteracia a rondar os mais de cinquenta por cento ou a desconfiança eminentemente latina.
Os mais demagogos ao tipificarem determinadas votações usam estes dados sociais conforme lhes convém. Evoca-se desde a sabedoria popular – embora seja verdade que os grandes números esbatem e adoçam a importância dos fenómenos de confundimento –, até à alusão de a mensagem não passar.
Há ironia no olhar o processo administrativo fundamental da regionalização. Anos atrás não passou em referendo e agora é pacificamente aceite. (…) Assim germina a crendice.
Nos tempos chegados as maiores fraudes nas empresas americanas e europeias foram trabalhadas por uma legião de licenciados das melhores universidades. Amaral Dias contrapunha há dias que o dinheiro substituiu a ética. Custa-me a dar-lhe inteira razão.
Não tendo o país qualquer solução boa ou melhor de curto e médio prazo para os resíduos industriais perigosos, deu cabo da incineração nas fábricas de cimento, apesar desta não ter praticamente quaisquer efeitos deletérios. E hoje, desde há seis anos, sem ruído, está a fazer a queima das farinhas resultantes do abate das vacas loucas e outros produtos exactamente nessas empresas.
A confiança é um valor mais palpável em sociedades desenvolvidas e tranquilas. Atitudes como estas miná-las-iam. Como o grosso da hipertrofia da desgraça influi sobre as nossas comunidades.
Se o país soergue a cabeça com iniciativas modelo a emergirem de cidadãos organizados logo outros as olham de través. As universidades seniores e as academias que evoluem por todo o lado, são caminho de ouro de travão à ignorância, provado o efeito no prolongar a capacidade intelectual no avanço da idade, e na longevidade mais segura. As instituições e as pessoas que equiparam ginásios em lares de idosos e schnootzers nos centros de paralisia cerebral – aliás, das iniciativas mais nobres que cresceram fora do Estado –, estão a melhorar a uma escala muito sensível a qualidade de vida de quem usufrui destes recursos.
Porém, como se a solidariedade fosse um fait divers entre gente cínica, ocupada com Obras mais válidas, nem são referência usual na opinião difundida.

Henrique Pinto
In Até o Diabo Tem as Malas Feitas, edição MinervaCoimbra

FOTO: Professor Carlos Amaral Dias

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