domingo, 6 de setembro de 2009

A CABEÇA VIRADA


O Hotel Lisboa Praia de Fortaleza é um agradável resort, quase em cima do mar. Para lá dos coqueiros uma multidão doce assola os incautos. Vende-se um sabonete, quem sabe se a renda para jantar – como será amanhã? -, tal os meninos de Marraquexe ou de Calcutá. Boa parte do Brasil está entre os trópicos, como a Índia. Podia ser o país mais rico do mundo. O clima produtivo e as relações humanas quentes pouco têm a ver com a origem do colonizador. Tudo se liga à latitude.
No Inverno da Europa gelada as pessoas estão também mais frias. A economia e a informação dão-lhes volta à cabeça. Atrás da proverbial arrogância francesa há má educação e fraca solidariedade, cenário há pouco invulgar. Ultrapassa-se à doida pela direita, buzina em punho. Nas avenidas cosmopolitas, Estrasburgo ou Sebastopol, africanos desempregados enrolam-se nas paredes exteriores das lojas, olhar perdido na fome e no amanhã. Fazem do Rossio lisboeta minúsculo ponto no cosmos. Os grevistas de San Lazare criam-nos pele de galinha, prenúncio do desespero, contagioso quanto o suicídio. As pessoas estão tontinhas, apáticas.
No menosprezo da ética e da inspiração democrática gerou-se uma máfia mais tenebrosa que as da Calábria ou da Rússia, a do colarinho branco, indutora da convulsão económica global. A xenofobia venenosa sai da boca de políticos antes tidos por sensatos, inflama quem sofre o ferrete do desemprego. Gordon Brown passa por ser um político sagaz na media ignorante, opressiva, quando só a soberba de a sua ilha estar de fora da zona euro lhe permite desvalorizar libra e juros. Com o tempo qual o preço desta política? Hoje os meus concidadãos parecem sentir-se os justos, imersos num caldo de intriga vil e peçonhenta, no desrespeito crescente e anárquico onde não flúem os valores mais nobres da Humanidade. Como se tudo isto acontecesse na serenidade dum raiar da aurora.
Por muito que esbracejem economistas que nada monitorizam e ainda menos capacidade mostram a prever, o discurso optimista moderado é essencial no controlo do pânico. Justifica-se ainda por nas economias mais fortes sobrarem cefaleias e dores de estômago de intensidade superior às nossas. Que dirão os senhores do poder nas ruas quando a situação apertar? Manterão o script estereótipo de «a culpa é do governo». Os oportunistas de sempre continuarão a despejar empregados, nafta de navio, aproveitando espírito e marés? Empresas e bancos do Estado persistirão líderes no deitar borda fora obrigações de responsabilidade social?

Hpinto
Setembro 09

In Diário de Leiria (adaptação)

FOTO: Gordon Brown, primeiro ministro do Reino Unido

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