domingo, 13 de setembro de 2009

OS BONS MALANDROS


Longe de mim supor-me iluminado da escrita. De Eça ou Joyce mais não terei que a curiosidade a interpretar o mundo. Poderá haver um ar de peregrino, que não Mendes Pinto. em certas das minhas crónicas. Ao menos o da romagem pelo mundo de ao pé da porta e pelo que bem dela dista. Até o sobrepor um estado e o seu contrário. O modo de ver tomando partido sem ter partido.
Já o disse, no Texas em 2001 bati palmas ao suposto «bom samaritano da América», George W. Bush. O sobrevindo a esse dia fez-me lembrar em cada instante minha educada imprudência.
É vulgar que os bons malandros passem a vida a referir-se à ética e que o mentiroso com melhor dom seja o que mais apela à verdade. Pelo meio da teia de humanas contradições há sempre o humor que adoça. No extremo é o ridículo das coisas sérias. Recordo o meu colaborador africano da OMS a não querer preservativos no «receio que a mulher o troque por outro». Ou até do padre empurrando até fazer dor numa bicha anómala dum aeroporto interno, algures no continente mais explorado, e alguém a deitar-lhe ao ouvido, qual aviso, «padre, está com pressa de chegar ao céu?». Que graça acho nos arrazoados de horas do comentador da TV sobre presidentes e treinadores, «a bem da transparência do futebol português», que o futuro infirma!
As cobras e lagartos que se atiçaram à descolonização portuguesa, feita com as tropas em convívio com os opositores! Dizia-se dos ingleses que tinham feito a sua muito bem. Este argumento hipócrita teria em conta o domínio britânico na Palestina, no Iraque no Tibete, no Zimbabué e na Índia e as sequelas de cem anos depois? Falariam então de quê? Tão grande é a fraqueza dos que se calam quando é preciso falar como dos que falam quando urge calarem-se.

Henrique Pinto

In Diário de Leiria, 2009, adaptação de «Tal qual um pôr do sol» do autor

Caricatura de Eça de Queirós, obra de Toni D’Agostinho, retirada com a devida vénia, in 50 razões para rir

1 comentário:

  1. Salve, Henrique!
    Muito obrigado por incluir meu blog nos seus links.
    Cordial abraço do
    Aluízio Amorim

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